Ela dizia-me baixinho que tinha saudades dele. Ela dizia-me,
de olhos desolados, que precisava, todos os dias, de exalar reentrâncias para pensar.
Só sabia que queria, mais do que tudo, cauterizar o coração dilacerado. Ou ambos.
Corações. O imago recluso da boca incapaz de articular um olá descuidado, não permitia que ela pudesse agarrar-lhe pela mão e
desfalecer-se em verdade do que mudou a direcção. Ela dizia-me que lhe tinha
custado não o prender nos olhos, repetindo o que carece repetir, serenamente. Ela
dizia-me e eu ouvia, arrendando a sua dor como se fosse minha. Aí eu
afirmava-lhe, segurando a sua mão magra, que eles estavam presos por coisas que
não se vêem. Sentem-se.
Ela voltava a dizer que só precisava de uma brecha. Pequena
que fosse. Que depois disso sabia bem o que fazer para limar as arestas
magoadas. Ela dizia que não queria ser como dantes. Só por lhe custar os portes.
Ela achava que ele não sabia que foi por isso que dele abdicou, vezes sem
conta. Mas ela abdicava sem quer perder tudo. Ela afirmava-me que não era
preciso tudo. Podia ficar alguma coisa, por mais que tal coisa indefinida e
aguada não substituísse o desejo. Aí eu repetia o que eu vejo. E tinha de lhe
dizer que é muito custoso por haver rastos e rasgos visíveis daquilo que havia
dito que não se vê.
Ela retorquia, sempre, que tinha saudades dele e que
precisava de uma fenda minúscula para voltar a abraçá-lo em paz, à noite, com
ou sem ele. E eu aí já não lhe disse mais nada.
Ana
... não há como retaliar quando se fala em paz...
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