06 julho 2013

pôr títulos.

Eu gostava de dizer que não gosto de me irritar. Eu gostava de pensar que se pode ser perfeitamente típico e gostar de estar numa serenidade aparente, um toldo de simpatia representativa. Eu gostava de puder afirmar que é bom estar sempre a rir, a sorrir ou à espera que alguém nos traga algum tipo de salvo-conduto para a felicidade ou para as oportunidades. Ou para qualquer sitio que não seja aquele que não reconhecemos como sendo nosso. O sentimento de pertença é tão precioso. Quem não o tem, deve estar morto, ou então não tem pele – tem escamas.

Mas o que eu aprendi, contigo, foi que isso não é possível. Pelo menos para mim. E era eu que importava.

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Hoje teria sido dia de tomarmos um café. E até se pode dizer que tu estavas lá, à minha espera, na mesa do costume, já de cigarro aceso, com uma garrafa de vinho caríssimo e um alguidar cheio de limões partidos às rodelas a boiar em água morna. Eu é que não fui, mais uma vez. Não me ocorre sequer pedir desculpa. Avisei-te da minha ausência e tu disseste que ficávamos, obviamente, por ali. E eu concordei. Foi tudo menos um tumulto, talvez por eu ter percebido que um dia chegaríamos ao fim. E quando digo fim, refiro-me aos encontros, aos cafés, às meias-de-leite e ao absinto que me obrigaste beber, por que eu quis. Quando digo fim, estou a falar de frio que me deixaste passar, por que tu querias estar na esplanada e eu precisava de me esconder de baixo de uma manta. Insistias muitas vezes que eu estivesse onde tu me sabias desconfortável. Insistias, outras tantas, que eu me refastelasse na copa de uma árvore, coberta de raios de sol, quando eu andava na ponta mais alta do cume do iceberg.

bonjourcherie.ca


Foi aí, nesse anda cá e chega-te para lá que se deu o upgrade? Não faço a mais pálida ideia. Só entendo, hoje, que tudo subsiste e subsiste apenas. Não preciso de adjectivos que qualifiquem – é uma realidade. Claro que tu sabes o quanto a prezo. Poucos mais podem entender.

Porém, ainda há coisas em que discordamos cabalmente. Sim, eu sei que sabes e sei que não te cabe na preocupação o que é que eu acho que devia ter sido mais perscrutado nos nossos motivos. Imagino que dirias agora, em tom inabalável, contudo longe de ser um entono acusatório, que eu é que me ausentei, em variados momentos. É verdade. Na minha cabeça existem muitos temas inacabados. O mais grave é que nenhum é sobre ti. O mais estúpido é que em nenhum consigo, ainda, pôr um título que tenha o meu nome. O mais triste é que, em algumas coisas, eu tenho razão, isto apesar de tu não queres que eu tenha razão, que essa desagúe em certezas e absolutismos, aos quais apenas chamo factos.

Mas afinal os factos não são apenas aquilo que se sabe?

Nunca quiseste que eu fosse influenciada pelas tuas posições. Nunca fui. Mas sei que tu te cansavas da permanência da minha hipomania a atirar ao mais velho Lobo Antunes. É que contigo eu não passava de um velho Lobo Antunes – disforme, confusa, recheada, cheia de rugas. Tudo isto sem ser mau. Pelo avesso – foi bom, muito bom. Foi mais uma faceta que pude experienciar. E o melhor de tudo isso que foi bom é que não precisei nem de te tirar fotografias, nem de te filmar. Acompanhas-me sempre que fico sozinha, permaneces sempre que preciso de cortar as pontas soltas.

Não sei dizer mais nada. Deixo-te só com uma frase. Nunca ta cheguei a dizer. Mas hoje apetece-me que saibas que "Ninguém é mais crédulo do que um desesperado." (A. Lobo Antunes). Agora já podes sentir orgulho de mim.



02 julho 2013

depois, já sabem.

Há pessoas peritas em criar lapsos descomunais, quando fisicamente se encontram a 3 ou 4 metros. Talvez até menos, ou talvez até mais. Essas pessoas desafiam as leis da física, do espaço e da temperatura. Aqui o tempo interessa mais. Em escassos segundos essas pessoas conseguem deferir pensamentos e sentidos, como se o isolamento fosse a única saída, passível de tornar o contorno delas numa borracha pouco maleável.


kootation.com


É… Parece que algo vai mal com elas. E vai. As dúvidas ininterruptas, o olhar descrente e baço, um bailado de dói-aqui-já-há-tanto-tempo, uma chuva de hidrofobia liquidada, um exagero emocional. Mas que é delas. E daí não passa. Não que resulte em traumas. Resulta em escolhas. É a gasta máxima do há uma linha que separa…, disfarçada, armada em ténue, mas que de fina nada tem. Nem de laivos esperteza. Pois há uma autenticidade, um cunho de inocência que se recusam a perder, por pior que tenham visto.

 E, se calhar, já viram. Já viveram tudo aquilo que não sabiam.

E depois já sabem.

E depois não querem.                                                                Assim, nunca mais. Nunca mais.


O inferno está dentro de cada um de nós e vale a pena guardá-lo. Só para se saber. Melhor.