27 abril 2014

Les Vieux Billets



Camadas de folhas amareladas
Guardadas numa velha caixa
Oferecida sem saber
Sem querer

Mostraste-a
Abriste-a

Ver conteúdos secretos
É como quem pode
Saltar pela cidade
Numa nudez extemporânea

Ler-te os versículos 
É como quem purga
Toda a tristeza das ruas 
Aquela terra batida

Petiz ainda que era
Percebi porém as tuas quimeras

Nada nos guia mais
Do que não saber nada
Neste carrossel imperante
Somando historietas negligentes. 


25 abril 2014

as pessoas e os trampolins

O Tomé tinha um amigo chamado Alberto. O Alberto era casado com a Rita, que tinha três cães de caça mas que detestava esse suposto desporto. Os cães da Rita não eram chamados à história; apenas servem para garantir que a Rita adorava cães e todos os outros animais - principalmente o marido. 

A Rita dizia todos os dias que o marido era um animal, por motivos muito válidos. Mas a Rita continuava com ele. Por causa de imensos motivos que nada tinham que ver com o Amor. O Alberto invejava o Tomé. Pode dizer-se que o Tomé era invejado pelo amigo Alberto pelo simples facto de se chamar Tomé e todas as outras coisas que faziam o Tomé ser um gajo cheio de sorte. Por sua vez, o Tomé estava apaixonado pelo Adérito mas não podia assumir por que, supostamente, o Tomé era muito macho, tanto que tinha uma tatuagem de um dragão que lhe ia do pescoço pelas costas abaixo. O Adérito tinha a mania que ele sabia tudo e que o Mundo e que estava tudo certo com ele, até porque ganhava várias vezes no bingo e o patrão estava satisfeito com ele. 

A Rita estava cansada de passar a ferro e contratou uma empregada. 

A Tânia. 

Esta última era perfeitamente dispensável, por que a Rita não fazia nada se não pensar como havia pentear o cabelo. O Alberto andava irritado por causa do futebol e das notícias e da baba dos gémeos (que eram seus legítimos filhos com a Rita). O Adérito andava a fazer análises de mercado, muito ciente do que se passava com a economia, mas alheado do que passava com a Vera. E o Tomé passava o dia a tomar chá na Boavista, com a companhia de amigas loiras e morenas, dos doces de leite e chocolate e também da revista GQ. 

Um dia, a Rita partiu um dedo à conta de tentar segurar um monte de cd's da Tuna da sua antiga faculdade, que resvalaram por causa da Tânia, essa incompetente. O Tomé partiu um prato na casa de chá, por ter ouvido alguém dizer que a Beyoncé tinha um caso com o Obama. O Alberto partiu as trombas a um gajo que vendia telemóveis da candonga, só por que esse lhe pediu um cigarro, ele que tinha deixado de fumar! E o Adérito encontrou a paixão da vida dele. Pois, era a Vera, que se cansou e fugiu com o Litos para o Chipre. O Litos era jogador de andebol. O Adérito só encontrou a Vera depois de ver as fotos do Chipre no facebook. 

Conclusão, a Rita não passava de uma mulher de trazer por casa. O Tomé era apenas uma pessoa bastante nervosa. O Alberto era um brutamontes. 

Já o Adérito... Se querem mesmo saber. O Adérito... Meteu-se no álcool. E só por isso a Agustina bebeu aquela garrafa de vinho sozinha, seguida de dois shots de absinto. 

Só lhe restava escrever.




16 abril 2014

Ele há palavras que dão cabo de tudo

Eu gostava de ter um blogue daqueles de trazer por casa. Daqueles bem simplórios que falam do cocó do cão e do vizinho que teve uma inundação em casa. Eu gostava muito de escrever textos sobre o sr. da tv cabo, da mercaria que não tem panos da swiffer, do creme para as rugas. 

Na verdade, eu gostava muito de me preocupar com rugas e com o que comer amanhã. Gostava de fazer balanços que incluíssem as minhas expectativas face à falta que me fazem os tempos áureos. Eu gostava mesmo de acusar a vida de ser madrasta. 

Mas não consigo. 

Talvez por isso, tão poucos são os que me conseguem aturar nisto de tornear sentidos em montanhas de palavras. 


14 abril 2014

Conselho caricato e tardio (OMG) a esta altura do campeonato

Sempre ouvi dizer que

_pretensão e água-benta, cada um toma a que quer. 

No entanto, não será tão simples assim. Acho caricato, das variadas coisas que acho caricatas, que existam pessoas que fazem de tudo para chamar a atenção dos outros, em laivos de ridicularidade tão brutais que se fragilizam perante quem tentam oprimir. E acho que a piada está, sobretudo, em dizer isto e aquilo sem pensar que, talvez, as conclusões que se tiram são maioritariamente pela rama. 

_pela rama. Expressão que utilizo com regularidade. 

É que isto de andar no tempo, nada tem de ver com castelos no ar ou edificações de betão. Tem que ver com pessoas. Muito mais interessante. E, claro está, antes de olhar para o lado, gosto de me olhar no espelho. A fundo. Nem imaginam as coisas que esse nos devolve. Assim, logo de manhã cedo

_sem maquilhagem
_com os dentes por lavar
_sem a carteira
_nua. 

Por falar em nudez, refiro aquela que só faz sentido em casa 

_essas quatro paredes ao alto que onde estão todas as coisas que trazemos cá dentro. 

Obviamente que depois disto tudo e pela primeira vez neste blogue, vou atirar um conselho a quem o quiser agarrar

_deixem de projectar nos outros as merdices que trazem aí dentro. A isso, chama-se honestidade. A maior que conheço. 

É feio. Mas é mesmo muito feio cuspir onde já se foi feliz. 


04 abril 2014

como diz o Bon Iver: "and at the end of all your lines"



se a vida fosse uma linha, seria tracejada algumas vezes. outras talvez um traço grosso e preto, quase como um borrão. tantas outras seria talvez um arco-íris com muitas luzinhas a saltarem de umas cores para as outras. 

se a vida fosse uma linha, dou conta que muitas vezes deslizo em cima dela como em corda bamba. se tenho medo? imenso. mas lá sigo na linha fina ou espessada, preta ou colorida. não tem grande sentido perceber se vou à frente ou atrás. vou na minha, de braços abertos - quem precisa de ser agarrado tem de os manter bem abertos. acho eu.

e o medo? quando aparece, aprendi a responder-lhe "e a vida?"







02 abril 2014

espantos



...


é estranho e embaraçoso quando te dás conta que já não és capaz de discernir se cheiras a ti, ao teu perfume, às lembranças fugazes que ele te deixa ou se cheiras mesmo a chicla de algodão doce. 



de qualquer forma, os dias crescem, deixando atenuar a majestade dos adeus.


é rápido, muito rápido.